O Anátema de Zos

UM SERMÃO PARA OS HIPÓCRITAS

Hostil ao cilício e aos vãos apelos que são chamados devoção, Zos se satisfazia falando em voz alta consigo mesmo. Certa vez, retornando à familiar consciência, surpreendeu-se ao perceber que era atentamente ouvido por um grupo de mendigos, párias, prostitutas, adúlteros, homossexuais, além de outras aberrações que podem ser facilmente encontradas na civilização. Sua irritação foi enorme, ainda mais quando eles o importunaram, dizendo:

MESTRE, QUEREMOS APRENDER MAIS SOBRE ESTAS COISAS! ENSINA-NOS A RELIGIÃO!

E olhando, com desgosto, a esperançosa massa de crentes, Zos desceu até o vale do Estige, furioso por tê-los como seguidores. E quando se cansou, moveu os lábios com escárnio, dizendo:

Vocês, cujo futuro jaz em outras mãos! Semelhante condição não é consequência de minha própria impotência. Sou Zos, pastor de bodes e salvador de mim mesmo – algo de que não me arrependo. Foi por si mesmos que ouviram meu solilóquio? Escutem, pois, o meu anátema!

Devoradores de tolices! Acaso estão mergulhados em seus próprios excrementos? Parasitas! Tendo feito do mundo um lugar asqueroso, imaginam ter alguma importância para Deus?

Desejando aprender pensam escapar ilesos à responsabilidade pelos frutos de sua ignorância? Quanto mais analiso, menos inocentes vocês me parecem! Renegando minha seara de vícios, devo eu satisfazer à sua sanha moralista? Eu, que utilizei meu corpo de maneira incansável, preferiria visitar um covil de lobos a entrar em vossas casas imundas.

Sensação… Nutrição… Mastigação… Procriação… Este o seu ciclo de vermes! Produziram um mundo curiosamente sangrento para esse amor que tanto desejam. Será que nada muda, senão através de sua horrível dieta?

SE SÃO CANIBAIS, que carne devo oferecer? Após comerem seus próprios mortos temperados com imundície, vêm agora como corvos esfomeados devorar meus exercícios mentais?

Com seus próprios conflitos, o que obtiveram? Vocês, que acreditam que a procriação é fundamental, são na realidade a escória manifesta da criação, abandonando a simplicidade original para se esfaimarem, e se tornarem, e perceberem que não são NADA. Confundindo o tempo com a personalidade. Já pensaram em reter SENTIMENTALMENTE o sêmen? Rejeitam a sexualidade com essa ética decorativa, vivendo da rapina, rezando, como grandes idiotas que são, e dizendo que tudo é possível, justamente para vocês, QUE SÃO IMPOSSÍVEIS. Mas seus desejos de salvação são inúteis para o prazer.

Em verdade, é tão difícil para os loucos entrar no Paraíso quanto para os leprosos da Moral. Que diferença há entre a vida e a morte? E entre o sonho e a realidade, que diferença há? Conhecem vocês algo além de seu próprio fedor? Sabem vocês se o que pensam que sabem é realmente aquilo que pensam? Mas devo reter minhas palavras. Ainda que este Sol seja gentil ao contemplar-me, e minha fraqueza encubra minha insatisfação para com a solicitude que demonstram… porém, sejam todos vocês amaldiçoados antes que obtenham quaisquer dádivas de mim!

Malditos sejam os que ressuscitam! Há apenas corpo e alma? Não há nada além do ente? Nenhuma aquisição além do sentido e do desejo de Deus, além dessa explosiva e devoradora horda que representam?

Oh, favorecidos pelos próprios perdões, gargalhando em meio a flagelos! Os céus são indiferentes a sua salvação ou sua catástrofe. Sua inflexível tortuosidade os fez despencar para uma terrível fatalidade!

O quê? Amenizar sua auto-piedade, curar seus corpos decadentes, preservar sua lamentável apoteose de si mesmos? O golpe de uma espada envenenada é o que tenho aqui!

Serei eu seu guardador de porcos, acaso pensam que serei pastor de bodes? Meu prazer não é obtido entre vermes com ideias vãs e esperanças e medos de absurda insignificância. Ainda não desisti de mim mesmo. Não amenizarei a abominação, pois nela acima de tudo vejo seus ancestrais, nos estigmas de sua tola dieta. Nessa descolorida intoxicação de hipocrisia, nesse monumental e mesquinho engodo, onde está o místico simpósio, a hierarquia dos nigromantes onde está?

Honesta foi Sodoma! Sua teologia é uma poça de lama ininteligível tornada ética. Em seu mundo, onde ignorância e fraude constituem a felicidade, tudo resulta miseravelmente falso, afogado no sangue do fratricídio. Buscam a salvação? Só se for a salvação pela digestão de sua dieta doentia; crenças inertes; anseios em convalescença. Seus preceitos provisórios e preces fedem em todas as narinas!

Infelizmente para suas almas, sua metamorfose é um laborioso renascimento mórbido que dá abrigo a sentimentos desregrados, horrendas familiaridades, um pandemônio de caligrafia – um mundo de abundância, obtido através da ganância. É por isso que vocês são párias! Habitam masmorras; seus gloriosos palácios são hospitais no centro de cemitérios. Vocês aspiram felizes o ar fétido dessas fossas? Obtêm o que querem de maneira incompleta, com suas conversas tortuosas, cheias de malícia, de promessas repletas de meandros, que desmoralizam a justiça! É assim que percebem o Paraíso – se é que ele existe?

Crendice sem associação… vocês são espúrios e não conhecem o caminho da virtude. Não há virtude na verdade, nem verdade na justiça. A lei surge do desejo pelo necessário. Corruptos são os professores, pois os que ensinam apenas desperdiçam palavras.

Crença ou blasfêmia! Suas palavras vêm daquele local entre suas nádegas? Crer ou descrer, eis a questão. Na verdade, se acreditam ou não é o que menos importa – o que precisam é acrescentar. Surgiram de tudo, têm todo conhecimento e, contudo, com sua estupidez só fazem aumentar o grau de sua própria miséria!

Seu desejo? Seu Paraíso? Afirmo que seu desejo é mulheres. Seu desejo em potencial é um prostíbulo. Ah, vocês que temem sofrer, quem dentre vocês tem a coragem de atacar os tênues inimigos dos credos, das pias esperanças estomacais? Eu insulto seus mandamentos para provoca-los e me divertir com seus ganidos, com o rangido de seus dentes!

Sabem o que querem? O que pedem? Sabem a virtude que há num grunhido maníaco? Pecado na loucura? Querem um professor que nada consiga ensinar? Brutalmente ensinarei o evangelho do suicídio da alma, da contracepção, e não o da preservação e procriação! Tolos! Fizeram vital a crença de que o Ego é eterno, alcançando assim a ideia de que não estarão perdidos!

Tudo advém dos desejos; as pernas para o peixe; as asas para o réptil. E assim lhes veio a alma.

Escutem, seus vermes!

O HOMEM DESEJOU O HOMEM!

Seus desejos se tornaram carne, seus sonhos realidade e nenhum temor poderá mudar isso. Ainda que eu viaje com vocês pelos abortos da encarnação – as aberrações, o horror vazio de sexo – é inútil oferecer a vocês a nova sexualidade do Paraíso. Uma vez neste mundo pude rir – quando me lembrei do valor que dei ao desprezível; a significância que conferi a meus medos egoístas; a vaidade absurda de minhas esperanças; a lamentável justiça chamada EU.

E VOCÊS?

Certamente de nenhuma ajuda serão as lágrimas de sangue ou as gargalhadas dos deuses. Vocês não se parecem com HOMENS, e sim estranhas manchas de algum esquecimento ridículo. Perdidos entre ilusões, tornaram-se dúbios – são estas as diferenciações que fazem para a futura entidade que guiará seus egos bestiais? Milhões de vezes renasci, e muitas vezes mais SOFREREI a existência.

Vocês são como distúrbios vivendo as verdades que criaram. Apenas perco tempo ao transbordar… tenho alguma chance de ensiná-los quem são? Em meu transbordamento satisfará o faminto sua sede de bem e mal? Não confio nisso… confio apenas no destino.

Ouçam o que penso: quero ser um estranho para mim mesmo, o inimigo da verdade. Em que exatamente acreditamos, com nossos desejos incompletos? Mas creiam nisso… se servir à sua dialética:

Circunscritas apenas ao egoísmo, as espirais do meu ódio agora falarão. Contudo, para ventilar meu espírito sadio, rirei de sua pueril dignidade, de suas absurdas vestes morais e sua fé bovina num fortuito, faustoso futuro!

Cães lambendo seus próprios vômitos! Malditos sejam vocês todos! Bactérias, adúlteros, larápios, carniceiros, agiotas, charlatães! Pensam que o Paraíso é algum tipo de enfermaria?

Vocês não sabem o que é o prazer. Em sua luxúria dormente, violência decrépita e doentia moralidade, são mais desprezíveis que os animais com os quais se alimentam. Eu detesto seu Mammon. A doença faz parte da sua abundância. Guardem-na, portanto… já que não sabem como usá-la.

VOCÊS SÃO UNICAMENTE BONS ASSASSINOS.

Cosmos vazios são aqueles que buscam a justiça. A misericórdia se desgastou. Extintos estão os puros de coração. Governados, aqui nesta terra, são os pacatos, e no Paraíso também o serão. Sua sociedade é uma redundante barbárie. Vocês são primitivos precoces. De onde vem seu progresso, senão através do ódio? Não há boa vontade em seu mundo – nessa transição sangrenta da procriação para a carnificina. Por necessidade odeiam, e amam seu vizinho devorando sua carne.

Os profetas são nauseantes e devem ser perseguidos. Objetos de ridículo, seus escritos não podem estar entre quaisquer doutrinas. Se ações são o critério, então como podem repetir as mentiras que ouviram de outros?

O Amor seja maldito. Seu desejo é seu Deus e sua execração. Seremos julgados por nossos apetites.

Vejo ao meu redor a configuração que tomaram – repito, um ajuntamento de porcos. Repulsivo alvo de caridade! A maldição foi pronunciada; vocês são o lodo que surge do suor, são como quadrúpedes homicidas. E novamente seus pais clamarão pelo auxílio das mulheres em seu inútil empenho pelo putrefato Reino do Bem e do Mal. Digo que o Paraíso é católico – e ninguém entrará nele se também não o for. Malditos serão os que forem perseguidos em meu nome. Digo que estou inteiramente convicto, que sou excessivamente maldoso, pervertido e nem um pouco transigente. Quem comigo ficar não será mais do que sou, nem mais do que aquilo que já é.

Zos, cansado mas profundamente contrariado com seus ouvintes, novamente os injuriou, dizendo:

Chacais viciados em vermes! Continuarão a lambiscar meus vômitos? Quem comigo ficar tornar-se-á seu próprio inimigo; pois minha exigência será sua ruína. Vão trabalhar! Preencham o desgosto de serem quem são, de descobrirem suas crenças, e talvez adquiram alguma virtude. Deixem que seu bem seja acidental; ou então fujam, satisfeitos em sua vanglória lamentável, pois a fúria do Paraíso será pesada para com sua gratuita auto-indulgência.

Em seu desejo de criar um mundo, façam aos outros como gostariam que fizessem a vocês – se tiverem coragem suficiente. Para dividir, não para salvar, eu vim. Inexoravelmente seguirei meu destino; esmagarei a lei, farei pilhéria com os charlatães, os místicos, os revolucionários e salvadores belicosos com seus empolados palavrórios fantasmagóricos; desmascararei e despertarei todo e qualquer pavor que haja em seus naturais egos de rapina.

Vivendo a mais desprezível das vidas e gerando apenas bestialidade, são tão imbecis a ponto de esperar algo pior do que possam imaginar? A honestidade é muda! Aconselho que façam um holocausto com seus santos e suas desculpas: os flatulentos arrulhos de sua ignorância. Apenas então poderei assegurar seus desejos lamentosos – remissão para seus pecados retocados.

Criminosos da loucura? Vocês só pecaram contra si mesmos. Não há pecados para aqueles que desfrutam das delícias do Paraíso. Queria que não resistissem em empregar sua maldade; isso é temor, e sonambulismo nascido da hipocrisia. No Paraíso do prazer toda lei será desrespeitada antes que esta Terra passe. Pois estou possuído, e minha bondade por vocês será vulcânica.

Aquele que é fora-da-lei é livre. Necessidade e tempo são fenômenos convencionais. Sem hipocrisia ou medo podemos fazer o que quisermos. Aquele, portanto, que quebrar os preceitos e viver essa transgressão, estará relativamente no Paraíso. Ainda que nossa justiça não exista, não temos prazer na liberdade ou na criatividade. Tanto pecamos contra a doutrina que nossa imaginação foi tolhida, como punição.

Isto foi dito sem pensar: “Não matarás.” Entre feras o homem vive supremo – com sua própria espécie. Presas e garras não foram acessórios suficientes para seu apetite. Há algo mais vicioso neste mundo que o comportamento humano?

Sugiro que seu amor nato pela moral gesticule e desmanche o atual, em benefício do sonho.

Rejubilem-se! Os legisladores terão o mais feio destino: o de se sujeitarem. Aquilo que é ordenado é suplantado – para que haja equilíbrio entre o acordo consciente e a hipocrisia. Poderão ser arbitrários? As crenças profetizam sua própria inversão. Sobrecarregados de desejos proibidos e fés contraditórias, vocês são suas próprias vítimas na moribunda e pueril lei.

O caminho para o Paraíso é uma proposta – anterior à mente e não induzida por ela. O desejo, acima das ações, deve estar em não ousar alcançá-lo: portanto, creiam SIMBOLICAMENTE – ou corram os riscos.

Entre homens e mulheres, desejo não é adultério. Gastem essa enorme luxúria e quando estiverem satisfeitos talvez encontrem algo novo. Hoje é tornado limpo fornicar, tanto por aquele que deseja quanto pelo que rejeita. Não ofenda seu corpo, nem seja tão estúpido a ponto de deixar seu corpo ofendê-lo. Como poderia reprovar sua dualidade? Deixe que sua maldição seja sua maior dádiva; é melhor se comunicar por atos que através de palavras.

Esse Deus – esse basilisco – é uma projeção de suas apreensões imbecis, suas vulgaridades despeladas e vaidades de hospício. Seu amor nasceu do medo; mas é melhor odiar que se decepcionar.

Farei seu caminho dificultoso. Dê e tire de todos os homens, indiscriminadamente. Conheço seu amor e seu ódio. Desejos de dieta sangrenta. Em seus estômagos há uma guerra civil.

Apenas no egoísmo há desejos de procriar.

E agora? Devo alcançar a sabedoria pelas palavras? Truques alfabéticos de prestidigitação gramatical? Não há verdade dita que não PASSE – sendo rapidamente esquecida.

Devo rascunhar paradoxos rasteiros em caligrafia alucinada? Palavras, meras palavras! Vivo num mundo sem palavras, sem passado nem futuro – e além da criação.

Todo imaginável procura por tempo e espaço. Assim, prefiro cuspir em sua ética esfarrapada, em seus provérbios putrefatos, sermões inarticulados de padres e jargões delirantes de púlpito. Apenas isto darei como resposta, como mandamentos aos seus cismas pestilentos:

“Melhor ser assim que se tornar temporário.

“Melhor ser assim que suplicar.

“Da Puberdade à Morte, realizar o Eu em tudo.

“Não há maior virtude que a boa sustentação.

“Alimentar-se das tetas, e se o leite for amargo, alimentar-se ainda…

“A natureza humana é a pior possível!

“Já vivi entre vocês. Pela minha própria decência, agora habito lugares longínquos, pária por opção; associado aos bodes, longe do asseio, o mais honesto dos homens.”

Com esta heterogenia da diferença, a realidade é difícil de perceber; a evacuação é custosa.

Os espiritualistas são sepulcros animados. O que é decadente deveria perecer decentemente.

Amaldiçoados sejam os que suplicam. Os deuses ainda estão com vocês. Assim, que os que orarem orem desta forma:

“Meu próprio Deus, estranho seja vosso nome exceto como blasfêmia, pois sou vosso iconoclasta. Eu lanço vosso pão sobre as águas, pois estou satisfeito com carne. Oculto no labirinto do Alfabeto está meu nome sagrado, o SIGILO das coisas desconhecidas. Na Terra meu reino é a Eternidade do DESEJO. Meus anseios se encarnaram na crença e se tornaram carne, pois SOU A VERDADE VIVA. O Paraíso é meu êxtase; minha consciência muda e adquire associações. Talvez eu tenha a coragem necessária para rapinar em minha própria superabundância. Esquecerei a justiça. Livre de qualquer moral. Guiado à tentação de mim mesmo, pois sou um reino instável feito de bem e de mal. Talvez consiga o suficiente através disso com que me comprazo. Talvez minha obliteração seja suficiente. A morte de minha alma. Intoxicação pelo egoísmo. Ensina-me a manter esta liberdade; pois sou Inferno suficiente em mim. Pecarei contra as menores crenças. AMÉM.”

Concluindo isto, Zos disse:

Novamente, Ó sonâmbulos, ladrões e sofredores, nascidos do estômago; homens desafortunados para os quais a felicidade é necessária!

Não conseguem viver sozinhos, não são suficientemente maduros para pecar contra a lei e continuam desejando mulheres.

Além da danação não conheço outra mágica que satisfaça seus anseios; pois crêem em uma coisa e desejam outra, falam de um jeito e agem de outro, obtendo assim seus valores vitais.

Certamente inclinações para novas faculdades brotarão de semelhante bastardia! Abertos apenas para as verdades convenientes à sua coragem, onde apenas as feras se desenvolvem.

Devo falar daquela densidade única e sem forma? Conhecem vocês o êxtase interno? O prazer que existe entre o ego e o eu?

No momento do êxtase não se pensa nos outros; pois NÃO HÁ PENSAMENTOS. Para isso não há guias.

Sem mulheres, seu amor é anátema!

Para mim, não há outro caminho além do meu. Portanto, sigam seu próprio caminho – ninguém os guiará por si mesmos. Deixem que o prazer seja seu pôr do sol.

HONESTO… SANGRENTO… GROTESCO!

Era sua proposta original a exaustão pelo divertimento de miríades de eus, através do êxtase? Estas infinitas ramificações da consciência na entidade, associando-se pela boca, pelo sexo, pelos sentidos!

A insistência quanto ao sexo se tornou uma pobre algaravia – repetição necessária para manter sua infantilidade? Sanguessugas! Devo ainda entretê-los com minhas explicações? Isso não passa de uma introspecção antropófaga na confusão da sua dieta – variando assassinatos contra seus ancestrais. Não há outra comida além dos cadáveres?

Seu assassínio e hipocrisia devem acabar antes que alcancem um mundo onde a carnificina não exista.

Assim, com a boca purificada, digo a vocês que vivo só de pão. Dormir é a melhor das preces. Toda moralidade é BESTIAL.

Contudo, resta ainda um grande erro. O Homem está morto. Apenas mulheres sobraram. Com boca luxuriosa direi: “Sigam-me! Percebam o que está oculto em cada sofrimento. Farei sua auto-mortificação ser voluntária, sua covardia ser corajosa.”

Ainda querem ficar comigo? Saudações aos suicidas!

Com um grito Zos se cobriu e adormeceu. Depois, um fedor o despertou – pois ele adormecera numa fossa – e ele percebeu que a multidão não estava mais ali, e que apenas porcos haviam restado. Ele gargalhou, dizendo:

Ainda não perdi minhas relações, e contudo me sinto asfixiado! Terei sido pego pela maquinaria do sentimentalismo, pelas alucinações morais da decadência e pela correnteza de esperanças e temores?

Transmutarão as eras o desejo? Ainda não me libertei da ilusão da realidade; pois não distingo homens de porcos, ou sonhos da realidade; ou terei falado apenas comigo mesmo? Nem mesmo sei dizer a qual deles, se a homens ou porcos, meu anátema seria mais indicado…

Meu insensível solilóquio foi devorado como uma revelação! O que disse com esforço para o desenvolvimento humano redundou apenas em grunhidos de suínos. A água sempre encontra seu caminho.

Mas não devo me entristecer, não, não agora! Pois enquanto cuspia em suas doutrinas, gravadas nas tábuas da Lei, ao menos não perdi a capacidade de sonhar.

E voltando-se para a luz do poente, Zos disse:

Ouça o meu desejo, Ó Glorioso Sol. Estou farto de que as serpentes de minha sabedoria escorram e derretam, inúteis.

Fora com as antíteses. Eu sofri. Paguei o preço.

Deixem-me ir, para recriar meu sono.

Aqui Termina Este Livro.

uma escrita automática por Austin Osman Spare tradução Fred Teixeira

 

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